
Inocência (1893), William-Adolphe Bouguereau
Em sua Primeira Epístola aos Coríntios, São Paulo exorta àquela Igreja Particular sobre o que é a caridade e seu verdadeiro sentido. Diz-nos que tudo pode ser feito, mas se não for feito com caridade, nada vale. Todos os dons: profecia, ciência, todos estes passarão. Mas a caridade, a maior das virtudes (cf. I Cor, XIII), não acabará.
“A caridade é paciente, a caridade é bondosa. Não tem inveja. A caridade não é orgulhosa. Não é arrogante. Nem escandalosa. Não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não guarda rancor. Não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a verdade. Tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. A caridade jamais acabará.”
— São Paulo, I Coríntios XIII, 1-8
Em sua encíclica Caritate Christi Compulsi, o Papa Pio XI nos diz que o amor demanda orações, penitências e sacrifícios ao exemplo do Amor. Exorta-nos à mortificação, para que através deste santo modo nos purifiquemos dos nossos pecados, tendências e paixões desordenadas. Para que sejamos puros, pois “Bem-aventurados os puros de coração, porque verão Deus!”. Somente os puros poderão ver e contemplar o esplendor da Sagrada Face de Deus. Ser puro é pedir com o salmista: “Fazei brilhar sobre nós o esplendor de Vossa Face.” (cf. Sl IV, 7). Mortificar-se é fazer-se unido à Paixão de Nosso Senhor e Redentor, e por isto mesmo, é partir como Santa Verônica para contemplar a Sua Face.
O Papa Bento XVI nos exorta em sua primeira encíclica Deus Caritas Est, nomeada atrás das palavras de São João, que a caridade nos move pelo amor a Deus, mesmo para aqueles com quem não nos agradamos ou desconhecemos. A caridade nos impele ao que é reto, bom, justo e verdadeiro e, desta forma, nos incita em disciplinar o desordenado, retificar o que é torto e corrigir o que é falso; incita o diminuir para que Ele cresça.
É necessário que o “amor próprio” morra para que surja a caridade; que a mesquinhez do orgulho, desapareça. É preciso esvaziar-se do “eu” para que não o homem viva, mas Cristo, Senhor Nosso, viva nele. É fundamental que a carne diminua para que venha a grandeza de alma. Porque a Santa Cruz é sinal de contradição!, e através d'Ela ganhamos a Vida.
Apesar de a Igreja estar a celebrar hoje a Solenidade da Ascensão do Senhor, as palavras da Quarta-feira de Cinzas devem sempre reverberar no mais íntimo da alma católica: “Memento, homo, quia pulvis es et in pulverem reverteris.” - lembra-te, ó homem, que és pó e ao pó retornarás. É com esta frase que a Igreja marca nossa fronte com as cinzas, para colocar o homem diante de sua própria fragilidade e mortalidade, e lembrar que a morte vem para todos. E então surge outro adágio, este romano: “Memento mori et carpe diem” - lembra-te de que és mortal e aproveita o dia. A única certeza desta vida é a morte, mas não é possível ao homem saber quando ela virá, por isso busquemos aproveitar o hoje, o agora, enquanto ainda respiramos e andamos nesta terra, para o arrependimento dos nossos pecados e a conversão, abandonando o “jeitinho brasileiro” de deixar as coisas para o último segundo, pois não há certeza do viver no amanhã, e se surpreendidos pela morte já não mais teremos tempo para fazê-lo.
No sermão da Missa deste último domingo (5° depois da Páscoa, calendário tradicional), o sacerdote nos exortou da necessidade de conversão: é preciso, com todas as nossas forças e com toda a nossa razão, que persigamos a reflexão para o arrependimento, a conversão, a santidade. Como soldados que treinam por toda a vida para caso hajam guerras, assim também é necessário que estejamos prontos para o chamamento divino.
Busquemos a prontidão na mortificação, na penitência, na oração, apegados ao Santo Rosário, pedindo as graças de Deus pela intercessão da Virgem Santíssima, para que buscando a pureza da neve (cf. Sl LI, 9) para permanecer em Deus, que é Amor (cf. I Jo IV), possamos contemplar Sua Sagrada Face após o nosso último suspiro. E antes deste chegar, estejamos sempre unidos à Paixão e Cruz de Nosso Senhor em nossas palavras, atos e pensamentos, em busca da perfeição cristã na imitação de Cristo, para que até na Sétima Palavra sigamos Seu exemplo de ardente caridade e compassiva firmeza em busca da salvação das almas.
Sempre abraçados à Santa Cruz, gloriemo-nos n'Ela, pois stat Crux dum volvitur orbis. - a Cruz permanece intacta enquanto o mundo gira.